Certo dia, na minha casa, eu estava deitada sobre o colo dele e ele me fitando e sem saber explicar lágrimas começaram a sair de meus olhos e ao mesmo tempo, olhando nos olhos dele, percebi que também estavam marejados de lágrimas. Isso pode parecer ridículo, pode parecer invenção, mas foi exatamente desse jeito que aconteceu, sem entender choramos olhando um para o outro.
- O que houve? Eu perguntei
-Não sei dizer. Respondeu ele. - Senti um aperto e também uma alegria e quando percebi já estava chorando.
Foram minutos de silêncio olhando um para o outro, eu senti o mesmo que ele e não sei dizer ao certo se a sensação era boa ou ruim, mas tal fato me marcou muito, pois vim a chorar muitas e muitas vezes depois, só que por um motivo que eu jamais imaginaria.
Eu trabalhava em uma loja de presentes, eu adorava meu emprego, foi o meu primeiro emprego e carrego comigo ótimas lembranças de lá, ele trabalhava em uma loja de ferramentas a pouco mais que um quarteirão do meu trabalho, isso facilitava para que nos víssemos mais vezes durante a semana.
O colégio em que eu estudava era caminho da casa dele, então, saíamos do trabalho e íamos juntos até o colégio e ainda sim, muitas vezes nos falávamos por telefone quando eu chegava em casa após a aula. Ele não estudava e eu não sabia ao certo o porquê, mas também, eu não era do tipo que fazia um interrogatório logo no começo do namoro. Ele era trabalhador e de família boa, fui muito bem recebida pela família dele, no começo, às vezes, eu sentia que eles me viam como a salvação para o Gabriel e eu não entendia o porquê, até que, um dia, estávamos sentados no banco do shopping, ele disse que queria conversar sobre o passado dele, sobre a sua história.
- Jú, faz pouco mais de dois anos que estou limpo - começou ele, e eu sem entender nada deixei que ele prosseguisse.
-Comecei a usar drogas ainda quando criança, logo que meus pais se separaram, não que isso justificasse - continuou ele - Na verdade, não sei se tem um motivo.
Ele fitou-me por alguns instantes esperando alguma reação negativa da minha parte, mas que reação negativa eu poderia ter se nem saber ao certo o que era drogas e diferenciá-las eu sabia?
- Na verdade, tem muita coisa sobre mim que preciso contar, sou filho adotivo, e também não uso isso como justificativa, mas minha mãe biológica, antes de me entregar ao orfanato, tentou me estrangular, eu quase morri por falta de ar, quando ainda era bebê.
Eu pude perceber a dor em seus olhos, eles pareciam arder em fogo, por mais que ele negasse, que ele dissesse que isso não justificava o fato dele ter começado a usar drogas, era difícil acreditar que ele, como filho, não sofresse por saber a verdade sobre sua mãe biológica, já está mais do que comprovado que a criança, quando não se sente amada, passa a ser uma criança insegura, e cresce com esse sentimento embutido em seu subconsciente, acho que com ele não foi diferente, pois em vários momentos, ele demonstrava ser uma pessoa totalmente insegura, com falta de autoconfiança.
- Mas a sua família adotiva gosta muito de você pelo o que pude perceber. Disse eu, tentando diminuir o peso das palavras que ele havia dito.
- Sim, eles gostam, mesmo depois de tudo o que eles já passaram por minha culpa. - ele fez uma pausa, mais uma vez, buscando em meu olhar alguma reação da minha parte, mas eu continuei firme, sentada ao seu lado segurando a sua mão.
-O que pode ser tão grave assim? - perguntei com um nó em minha garganta.
Desse momento em diante, passei a conhecer o sofrimento de um ex- usuário de drogas, que mais tarde, vim a aprender que não existe ex- usuário...
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