domingo, 22 de maio de 2011

Continuação Cap.I Pág. 13/14

Ele respirou fundo, com as mãos impacientes, talvez com medo de que
eu o desaprovasse por tudo o que ele estava prestes a me contar.
– Comecei a usar com a turma da rua, a turma do bairro, eu tinha por
volta de 13 anos.
Eu não acreditei... Ainda uma criança. Como, uma criança de 13 anos
começa a usar drogas?
- Comecei como tudo mundo, com a maconha, mas não demorou
muito e eu já estava na “pedra”. - ele me encarou e a dor que vi em
seus olhos me fez queimar por dentro, eu queria pedir para ele parar,
dizer para ele que nada que ele dissesse sobre o passado dele
importava, que ele deveria focar no presente, mas eu sabia que não
podia fazer isso, sabia que seria bom pra ele se continuasse, percebi
que ele estava ficando aliviado em me contar.
-Daí em diante, foi só desgraça, minha família sofreu muito, chegou a
pensar que não tinha mais jeito, peguei muita coisa de casa para
vender e comprar crack, minha mãe sofreu muito, meus irmãos
haviam perdido as esperanças de que eu me recuperasse, eu vivi na
rua, dormi na rodoviária, em banco de praça, virei às costas para a
minha família, fiz coisas das quais não me orgulho...
Ele começou a contar cenas da sua tragédia pessoal, parecia que eu
estava inserida em um pesadelo, daqueles em que você tenta gritar
mas, a sua voz não sai, fui dominada por um sentimento terrível de
impotência. O pior momento, o mais agonizante, foi quando ele
começou a contar sobre o dia em que abriram a porta de seu quarto e
sem ter tempo de reação, os enfermeiros enormes que mais pareciam
lutadores de jiu-jítsu o agarraram e ele foi levado às forças para uma
clinica de reabilitação, onde foi sedado com uma injeção de sossega
leão para acalmá-lo. Nesse momento, meus olhos já estavam cheios de
lágrimas, sinceramente, na época, eu não sabia como funcionava as
internações e nem sabia que ainda existia o tal método do sossega
leão, onde, para colocarem o paciente na ambulância, eles aplicam
uma injeção tranqüilizante e o mesmo, quando acorda, já está no leito
de um hospital psiquiátrico ou em uma clínica de reabilitação. Isso
havia acontecido com ele e me doeu mais ainda ao ouvi-lo dizer que
não foi uma única vez, que esse processo havia se repetido inúmeras
vezes, por culpa dele mesmo, porque, na verdade, ele não queria se
curar, não queria se livrar do vício, na verdade, não conseguia e por
isso acabava fugindo das clínicas em que era internado.
Ele estava de cabeça baixa quando disse - Você deve estar me
achando um monstro não é mesmo? Deve estar achando que fui
estúpido por não querer me curar, mas eu te digo uma coisa, eu não
acreditava que eu pudesse me curar, porque no final, o que tirava o
vazio que eu sentia dentro de mim, o que me dava prazer era a maldita
pedra.

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