quarta-feira, 30 de março de 2011

Internação à força - A visão de quem já foi internado

Ainda na reportagem da Marie Clarie, feita Por Maria Laura Neves e Tânia Nogueira, *Daniel, filho da primeira entrevistada, fala um pouco sobre as suas internações.

Daniel*, 28 anos, é casado, pai de dois filhos pequenos e mora perto da mãe. Inteligente, narra a sua trajetória com clareza e detalhes. A análise que faz dos seus problemas parece lógica, lúcida. A desenvoltura intelectual, no entanto, não é suficiente para esconder uma enorme ansiedade. acende um cigarro atrás do outro durante a entrevista. daniel precisa contar a sua história. Depois de quatro horas de conversa, estava longe dos acontecimentos recentes. Evidentemente, está buscando uma resposta para o porquê de tudo que lhe aconteceu. Fisicamente, aparenta ser saudável. tem olhos agitados. parece um rapaz bem-humorado e É bastante carinhoso. diz que, mesmo no período de maior uso do crack, nunca foi violento com a família. A seguir, o depoimento dele. Por Tânia nogueira

Fui internado quatro vezes, todas contra a minha vontade. Uso drogas desde os 12 anos. Ouvi que maconha relaxava e fui procurar a droga sozinho. Passei a fumar todos os dias. Experimentei cocaína pela primeira vez aos 15. Aos 19, veio o crack. Aos 21 anos, quando meu primeiro filho nasceu, estava cheirando todos os dias e fumando crack. O nascimento dele não me fez pensar na vida ou nas minhas atitudes naquele momento. Eu não me considerava um doente, um dependente químico e achava que tinha controle sobre o consumo de drogas.Até que comecei a me cansar das brigas com a minha mãe e passei a ter vergonha de ser o drogado da família. Pensei em parar. Diminuí o crack e a cocaína, me mantive na maconha. Se minha família tivesse proposto, teria me internado sozinho. Mas eles me pegaram de surpresa. Me senti traído no dia da internação. Fiquei confinado 15 dias e no dia em que saí estava tão revoltado que fui comprar pó.
Na segunda internação, minha mãe ficou comigo na clínica. Não adiantou nada. Usei crack lá dentro. Casei aos 22 anos. Graças a esse relacionamento, passei um tempo só na maconha. Mas recaí e voltei para o crack. Fui internado outra vez e foi aí que me dei conta do poder do crack sobre mim. Entendi que eu tinha uma doença. Quando saí, fiquei limpo dois anos. Minha filha nasceu e achei que nunca mais fosse recair. Até que comecei a tomar cerveja. Como controlava a cerveja, achei que controlaria a maconha. Em pouco tempo estava no crack de novo. Fui internado novamente.
Durante muito tempo, acordava todos os dias dizendo que não ia fumar crack, mas, no meio do dia, não resistia e ia atrás da droga. O crack me fazia sentir transgressor, poderoso. O fato de fazer alguma coisa que ninguém sabia me fazia sentir potente. Acho que é uma maneira de compensar a baixa autoestima que eu sinto desde os tempos de escola, quando tirava notas mais baixas que meus colegas por causa da hiperatividade. Na hora que usava, bloqueva os pensamentos e mentia para mim mesmo que aquilo não traria consequências para minha vida ou a dos meus filhos. Também me convencia de que fumaria só um pouquinho. A verdade é que sempre fui uma pessoa compulsiva, fumo três maços de cigarro por dia. Meu problema não é a droga e sim o que me leva até ela.”
*Os nomes foram trocados para preservar as identidades dos entrevistados

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